sexta-feira, 23 de fevereiro de 2024

CAPELINHA DE DONANINHA EM PACOTI - PROVA DE AMOR

 https://diariodonordeste.verdesmares.com.br/opiniao/colunistas/diego-barbosa/capela-na-beira-da-estrada-de-pacoti-foi-construida-como-prova-de-amor-eterno-1.3478703
























Entrevista concedida por ana margarida ao repórter do Diário do Nordeste - Diego Barbosa - que serviu de base para a publicação da matéria no Diário do Nordeste.


Olá, Ana Margarida, tudo bem? Diego Barbosa, repórter e colunista do Diário do Nordeste.

 

Conforme combinado, seguem abaixo as perguntas que desejo fazer a você sobre a história de Ananias, Donaninha e a Capela de Jesus Crucificado, em Pacoti. Essa história deve ser contada em minha coluna, com narrativas de amor.

 

1 - Por que a história da Capela de Jesus Crucificado, em Pacoti, envolve uma história de amor? Que história de amor é essa?

 

A “Igreja de Jesus Crucificado” conhecida como: “Capelinha do Arvoredo” e “Capelinha de Donaninha”, em Pacoti-CE, foi erigida por Ananias Arruda para sua esposa, Ana Custódio dos Santos Arruda (Donaninha), falecida em 19.01.1941, à margem da estrada que liga Pacoti à Guaramiranga.

Donaninha foi vítima de morte súbita – provável rutura de aneurisma cerebral congênito- durante um passeio domingueiro, ao lado de sua filha, Rocivalda, e de algumas senhoras que, como elas, estavam hospedadas no “Patronato Imaculada Conceição”, em Pacoti.

As grandes provas de amor descritas na história são monumentos que homens mandaram construir em memória de suas amadas. O mais famoso deles é “Taj Mahal”, edificado entre 1632 e 1653, em Agra, na Índia, pelo imperador Shah Jahan para a sua mulher preferida Mumtaz Mahal, que morrera ao dar à luz ao 14º filho.

No “Mosteiro de Alcobaça”, em Portugal, Dom Pedro I (1320-1367) mandou erigir um belo túmulo para Inês de Castro, sua amada, cruelmente sentenciada à morte por D. Afonso IV (1291-1357), pai de D. Pedro I.

Como prova de amor, Ananias não só erigiu uma “capela-cenotáfio” para sua Donaninha, mas manteve-se fiel à sua memória até seu último dia de vida, em 26.01.1980, com quase 94 anos, quando partiu ao encontro de sua amada.

 

2 - Na conjuntura social do Maciço de Baturité, quem eram Donaninha e Ananias Arruda? Como eles se conheceram, quando se casaram e que legado deixaram para a região?

 

Ananias Arruda (Ananias Abnegado Vasconcelos Arruda) nasceu em 23 de maio de 1886, em Santo Antônio do Aracatiaçu - distrito de Sobral. Em 1891, com cinco anos de idade, chegou à Baturité com seus pais: Capitão Miguel de Arruda e Maria do Livramento Vasconcelos Arruda, cinco irmãos e uma irmã, sua avó materna e duas tias maternas. Em Baturité, ele ganhou mais dois irmãos e uma irmã.

 

Ananias estudou as primeiras letras com professoras particulares e concluiu o curso de humanidades em Guaramiranga. Iniciou sua exitosa vida profissional e uma profícua atividade religiosa e social, orientado por seu pai e pelo Vigário de Baturité, Manoel Cândido dos Santos. Com 14 anos, em 1900, participou da fundação da “Conferência Vicentina São Luiz de Gonzaga” e, em 1901, fundou a “Escola Paroquial Menino Deus”.

 

Sua história de amor com Donaninha começou quando o cupido, sim, l’amour, como chamam os franceses, flechou os dois, em julho de 1911, na casa paroquial de Baturité, onde a bela adolescente passava as férias com seu tio, o vigário Monsenhor Manoel Cândido dos Santos.

 

Dois meses depois, em 17 de setembro de 1911, sob as bençãos dos familiares, o casal de nubentes trocou juras de amor eterno, ao receber o sacramento do matrimônio, oficializado por Manoel Cândido, na Matriz de Baturité. Ele, um jovem fervoroso, valoroso e promissor, de 25 anos, e ela, uma bela, meiga e piedosa adolescente, de 16 anos, selaram seus destinos para sempre.

 

Desnecessário dizer que foram felizes durante quase 30 anos, quando a morte, a “Indesejada das gentes”, ceifou a vida de Donaninha, precocemente, aos 45 anos. Foi um duro golpe, mas a fé retemperou suas forças e ele continuou sua jornada terrena.

Para homenageá-la mandou construir, além da Capelinha de Pacoti, outra em Saboeiro, na casa em que sua amada nascera.

 

Ananias, com o apoio de Donaninha, deixou para cidade de Baturité um grandioso legado, a saber: em 1917, fundou o Jornal “A Verdade”, semanário católico, mantido por ele até a década de 1970, quando passou a ser editado por seu sobrinho, Miguel Edgy Távora Arruda, até 1997 e, a partir de 1998 até o ano 2010, por seu sobrinho-neto Raimundo Luiz Furtado de Arruda.

 

Em 1924, participou da criação do “Círculo de Operários Católicos São José”; em 1927, por sua iniciativa e valorosa contribuição financeira foi fundada a “Escola Apostólica dos Padres Jesuítas de Baturité”; em 1930 e 1932, respectivamente, por sua iniciativa e contribuição financeira foram fundados: o “Colégio Domingos Sávio”, dos padres salesianos e o “Instituto Nossa Senhora Auxiliadora”, das irmãs salesianas.

 

Ananias trouxe para Baturité as Irmãs de Caridade e fundou a “Casa dos Pobres Luiza de Marilac”; em 1941, fundou o “Patronato Nossa Senhora do Livramento” e trouxe, para cuidar dos pobres, a Irmã Clemência, que será, brevemente, declarada santa pela Igreja Católica.

 

Em 1953, com ajuda financeira do grande baturiteense, Luiz Severiano Ribeiro, construiu a “Maternidade Maria Felicia Ribeiro”, para as Irmãs de Caridade de São Vicente de Paulo; em 1956, ao lado da maternidade, construiu o “Hospital José Pinto do Carmo”, com ajuda financeira de seu amigo Oziel Pinto.

 

Em 1956, construiu uma Igreja dedicada à Nossa Senhora do Livramento, em Aracatiaçú, ao lado da casa em que nascera sua mãe; em 1958, construiu com os próprios recursos e ajuda de famílias baturiteenses, uma grande Via Sacra e um belo monumento dedicado à Nossa Senhora de Fátima, de 9 metros de altura, que foi inaugurado em 1967.

 

Ananias foi nomeado prefeito de Baturité, em 1935, e essa investidura foi, posteriormente, confirmada por sufrágio popular; em 1938, recebeu do Papa Pio XI, o privilégio de ter uma capela em sua residência. Essa especialíssima concessão foi renovada pelos papas: Pio XII, João XXIII e Paulo VI até o seu falecimento.

 

Ananias promoveu mais de uma dezena de “Congressos Eucarísticos” com apoio dos arcebispos de Fortaleza: Dom Manoel da Silva Gomes e Dom Antônio de Almeida Lustosa. Em 1952 e 1958 foi agraciado pelo papa Pio XII, com duas comendas: Cavaleiro da Ordem de São Silvestre e de São Gregório Magno.

 

Ele e Donaninha não geraram filhos biológicos, mas foram contemplados com cinco filhos:  Miguel, filho de seu irmão Eurico, e quatro irmãos (Everton, Claudemir, Rocilvalda e Luiza) que haviam ficado órfãos.

 

 

3- Qual o seu parentesco com os dois? E que objetos/documentos guarda da época em que estiveram vivos? Eles viveram até que ano?

 

Sou sobrinha-neta de Ananias Arruda e Ana dos Santos Arruda (Donaninha). Meu nome “Ana” foi escolhido pelos meus pais para homenageá-la.

Meu avô paterno, Raimundo Arruda, era o irmão mais novo de Ananias Arruda e a minha avó materna, Adelina Arruda Furtado, era irmã dele (meus pais eram primos legítimos)

 

Após o falecimento de Ananias Arruda, em 26.01.1980, em Fortaleza, seu sobrinho, o historiador Miguel Edgy Távora Arruda, criou, em 1981, a Fundação Comendador Ananias Arruda, e, em 1986, inaugurou o Museu Comendador Ananias Arruda (Museu CAA), em sua residência de Baturité.

Além de móveis e objetos que preservam a memória do Comendador e Donaninha, o museu contém os exemplares do jornal “A Verdade”, a Tipografia do Jornal “A Verdade” com os tipos usados na época, fotos dos familiares, objetos e relíquias com oratórios e imagens sacras.

O Museu CAA preserva a capela, que foi reinaugurada em maio de 2022, com as imagens sacras da residência do Comendador e as imagens da Capela de Pacoti. Todas foram restauradas.

 

4- Qual a localização exata da Capela de Jesus Crucificado? E como está a situação dela hoje? Lembro de passar há alguns anos em frente e pensar que estava abandonada... Procede essa informação? A família ainda tem algo a ver com a capela?

 

A Igreja de Jesus Crucificado, construída em terreno, gentilmente cedido pelo Sr. Robert Gradvhool, localizado na estrada entre Pacoti e Guaramiranga, teve autorização oficial do Governo do Estado e aprovação do Sr. Arcebispo Metropolitano para ser edificada.

Foi benta e inaugurada por Dom Antônio Lustosa, no 1º aniversário de falecimento de Donaninha, na presença de Ananias, familiares, interventor Menezes Pimentel, Secretários de Estado, Jesuítas, Salesianos, Salesianas, Franciscanas, Capuchinhas, Irmãs de Caridade, associações religiosas, imprensa, grande número de sacerdotes, autoridades, famílias de Pacoti, Baturité, Fortaleza e Saboeiro e grande massa popular, havendo pregação preparatória de três dias, missas, grande número de comunhões.

De Baturité, vieram sete caminhões, um ônibus e um automóvel. Ao todo foram celebradas diversas missas até o cair da tarde na presença de centenas de pessoas que ficavam apinhadas fora da pequena capela.

Segue a descrição física da Capela no dia de sua inauguração.

Texto publicado no jornal “A Verdade”:

A Igreja de Jesus Crucificado foi construída por uma planta idealizada por Ananias Arruda, que administrou os serviços de sua construção que estiveram a cargo do pedreiro Clovis de Barros. Está localizada à margem esquerda da estrada Pacoti-Guaramiranga, sobre uma barreira na altura de 2 metros acima do nível da mesma estrada, para a qual se sobre por duas escadarias de marmorito que terminam num pórtico externo sobre o qual se eleva uma bela torre assentada em colunas e desenhada por Orlando Luna Freire de acordo com o plano projetado. Tem 5 altares. O principal que é dedicado a Jesus Crucificado, se acha em frente ao pórtico da torre com paredes circulares que terminam em abóbada com vitrais verdes e brancos tendo um deles a forma de Cruz, em frente do qual está uma imagem do Crucificado tendo ao pé as imagens da Virgem Dolorosa, S. João Evangelista e Santa Maria Madalena.

Ananias Arruda pede a todas as pessoas que visitarem esta Igreja, uma prece a Deus pela maior glorificação no Céu de sua querida e inesquecível consorte Donaninha Santos Arruda.

Este belo e histórico conjunto arquitetônico, composto pelo cenotáfio, de um lado da estrada, e da capela, do lado oposto, é tombado pelo Patrimônio Público de Pacoti. Foi restaurado pela prefeitura de Pacoti, para o aniversário de 80 anos da morte de Donaninha, por iniciativa do historiador Levi Jucá. 

 

5- O que a história de Donaninha e Ananias representa para você e, mais ainda, para a região do Maciço de Baturité? É uma história conhecida ou precisa ser mais divulgada?

 

Para mim, a história de Ananias e Donaninha é fonte de inspiração e exemplo de vida. Não só para mim, mas para todos os seus inúmeros sobrinhos espalhados por vários Estados do Brasil. Essa bela história de amor e fé precisa ser mais divulgada.

 

 

6- Enquanto historiadora, qual o valor da origem da narrativa envolvendo Donaninha, Ananias e a Capela de Jesus Crucificado? Pesquisando sobre eles, o que mais você achou? Onde estão esses arquivos, são de fácil acesso?

 

Como historiadora, tenho o dever de preservar a história deste casal e de Baturité para as gerações futuras.  O Museu Comendador Ananias Arruda, que guarda essa história, pode ser visitado no seguinte endereço:  Av. 7 de Setembro, 1097, Baturité-CE. Horário: de terça a sábado, 9h às 17h e domingo, 9h às 12h.

 

Blog do Museu: https://blogdomuseucomendadorananiasarruda.blogspot.com/

YouTube:  https://www.youtube.com/channel/UCKthCm3tPfsu10vGU3APG9Q

 

 

7- Além de você, quais outros parentes dos dois ainda estão vivos? Como eles enxergam a história do casal? E o que também guardam de documentos/arquivos?

São muitos os sobrinhos, familiares e amigos do casal “Ananias e Donaninha” que são vivos e colaboram para a preservação do Museu, tendo à frente o Presidente da Fundação e Diretor do Museu – Raimundo Luiz Furtado e Arruda – sobrinho-neto do Comendador.

 

 

8- Por fim, você, feito Donaninha e Ananias, também é católica devota? Reside também em Pacoti? E existe um desejo maior seu para a Capela de Jesus Crucificado enquanto estrutura - sobretudo no que diz respeito à conservação do patrimônio?

 

Não sou devota, como Ananias e Donaninha, mas a família tem incontáveis devotos, incluindo padre e freira, sobrinhos do Comendador. Por outro lado, trago comigo a força do amor de Ananias pela Donaninha.

O amor por meu falecido marido, que persiste até hoje, me fez escrever o livro “Confissões de Amor – Margô e Rose”, recheado de fotos, de cartas e poemas de amor que trocamos em vida. Acho que o meu amor por Rosemberg é tão forte quando o tio Ananias pela tia Naninha. Resido em Fortaleza,  mas estou sempre visitando  Baturité e Pacoti, em busca de minhas origens, pois nasci em passei a minha infância  em Baturité.

 

9- Como lhe referencio na matéria? (nome e sobrenome, idade e ocupação)

 

ana margarida furtado arruda rosemberg (médica, historiadora especialista em história da arte e escritora), 73 anos, membra da Academia Cearense de Medicina, da Sociedade Brasileira de Médicos Escritores-Capítulo Ceará e da Sociétè des Amis du Louvre. 

 

De forma a otimizar a escrita do material, peço que envie as respostas até amanhã (15), às 8h. Além disso, para ilustrarmos a reportagem, é essencial termos fotos do casal, por isso peço que envie também.

 

Fico no aguardo de um retorno e, desde já, agradeço pela atenção e apoio.